Apesar de ter morrido em 1900, os pensamentos do filósofo Friedrich Nietzsche se mostram tão atuais e úteis para compreendermos a humanidade de hoje quanto os memes da internet. Escrever seu nome sem a ajuda do Google e pronunciá-lo da forma correta (que é Níti, com ênfase no primeiro “i”) pode ser uma aventura. Mas suas ideias estão tão enraizadas na sociedade que, às vezes, sequer percebemos que estamos filosofando — se você já cantou “whatdoesn’t kill you makes you stronger” (“o que não te mata te fortalece”), da Kelly Clarkson, você já conhece, pelo menos, uma ideia do filósofo. Conheça um pouco das outras:

O conceito do Super Homem

É tentador relacionar o Super Homem(“übermensch”) de Nietzsche com o Super Homem da DC. Mas, apesar de Henry Cavill responder a todos os quesitos estéticos da sociedade moderna, ele não tem nada a ver com as ideias nietzschianas. Segundo o filósofo especialista em Nietzsche Oswaldo Giacóia, da USP, o Super Homem (ou Além do Homem) poderia ser representado por aquele que encarara a vida sem as muletas que o homem usou até hoje para poder suportar a existência, como a religião ou a moral, por exemplo. Segundo Nietzsche, estas muletas seriam uma negação da morte. Seria por causa dessa negação que as pessoas acreditariam em falsas promessas como o paraíso, por exemplo. Portanto, o Super Homem seria um ser superior, uma ideia melhorada de nós mesmos: não na força, mas no psicológico.

Se você achou essa ideia de “ser superior” um pouco nazista, saiba que Hitler também. Durante muito tempo, as ideias do filósofo foram usadas como justificativa para os horrores da Segunda Guerra Mundial. Grande parte por conta da má interpretação de alguns estudiosos.

O Eterno Retorno

Não é raro levantar cedo para ir ao trabalho, encostar a cabeça no vidro do ônibus e pensar: “Que m… eu estou fazendo com a minha vida?”.  E se você tivesse seguido o sonho de abrir um bar na praia em vez de estar sendo sugado por uma empresa que nem te paga tão bem assim? Você realmente está aproveitando a existência na Terra ou só está vendo-a passar através da janela?

Na obra A Gaia Ciência, Nietzsche nos presenteia com um exercício mental intrigante: “E se um dia um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: ‘Esta vida, assim como tu vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes: e não haverá nada de novo, cada dor e cada prazer (…) há de retornar (…). Não te lançarias ao chão e rangerias os dentes e amaldiçoarias o demônio que te falasse assim? Ou viveste alguma vez um instante descomunal, em que que lhe responderias: ‘Tu és um deus e nunca ouvi nada mais divino!’”. A forma como você reagiria à proposta do demônio diz muito sobre o modo como você leva a vida e faz questionar (muito) sobre o rumo que dá a ela e como toma suas decisões.

Deus está morto

Nietzsche não gostava muito da igreja católica. A afirmação que fez na obra O Anticristo, de que “Deus está morto”, causa mini infartos nos cristãos até hoje. A principal ideia que o filósofo atacava era a da moral cristã. Para ele, os cristãos não são bons (ou tentam ser) porque se preocupam com o próximo, são bons porque têm medo de queimar no inferno. Não é uma bondade genuína. Segundo ele, é nesse medo da punição em que se baseia toda a fé cristã. Por isso, ele propôs uma ideia de ética que dependia simplesmente da própria pessoa — que não deveria acreditar em recompensas além da vida ou em deuses que o tratassem como gado. Ou seja, a pessoa seria boa simplesmente porque assim ela se sentiria bem consigo mesma e não porque uma entidade superior e vingativa puxaria seu pé à noite.

Ele não via sentido em negar o sexo, o corpo e o amor. O filósofo se perguntava: “Que validade tem, afinal de contas, ser cristão se este vive ameaçado pela terrível punição de ser excluído da presença de Deus se não se comportar ‘bem’?”. Isso sem falar na noção de culpa que vem de brinde. Por isso, Nietzsche defendia o fim da moral cristã, atacando sua principal incentivadora: a Igreja. Mas, diferente de Marx, por exemplo, ele não achava que seria preciso uma revolução para isso. Mas, sim, um questionamento individual que faria cada um perceber que ser cristão era entregar sua vida a uma ilusão sem sentido.

Niilismo de Nietzsche

(Muito) basicamente, o niilismo é a descrença total nos valores impostos pela sociedade. Para os niilistas, a vida não deve ser regida por nenhum tipo de padrão que nos foi ensinado pela escola, pelos pais ou assistindo à TV Cultura. Deus? Não acredito. Pecado? Não acredito. Lady Gaga como a nova Madonna? Faça-me o favor… Não é a toa que Nietzsche era um verdadeiro hater da moral cristã. E o que acontece quando se deixa de acreditar no sentido das coisas? A pessoa cai no vazio absoluto. Restaria apenas esperar pela morte. Mas Niezsche não acreditava nisso como saída, para ele, quando se mata Deus, a pessoa se torna responsável por criar suas próprias regras, usando o conceito de Eterno Retorno como guia.






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