O ano de 2019 está chegando ao fim e o Google preparou a retrospectiva dos assuntos mais buscados pelos brasileiros ao longo dos últimos 12 meses, e quando a pergunta foi em “Como fazer”, chamou-nos a atenção para o item 3 da lista: “Como fazer que as pessoas gostem de mim?”
Ora, é muito compreensivo que esta pergunta esteja no topo da lista. Como nos ensinou o sociólogo polonês, Zygmunt Bauman: “Estamos todos numa solidão e numa multidão ao mesmo tempo”.
Ao mesmo tempo em que experimentamos o isolamento protetor de nossos lares, vivenciamos uma absoluta exposição nas redes sociais. Não há o privado, tudo é desvendado: o que se come, o que se compra; o que nos atormenta e o que nos alegra. O amor é mais falado do que vivido. Vivemos um tempo de secreta angústia. Filosoficamente a angústia é o sentimento do nada. O corpo se inquieta e a alma sufoca. Há uma vertigem permeando as relações, tudo se torna vacilante, tudo pode ser deletado: o amor e os amigos.
Há uma angústia latente em nós. Um vazio existencial que nos acompanha desde o ventre materno, quando fomos “expulsos do paraíso”. O “paraíso”, o ventre materno, era o lugar onde tudo que necessitávamos nos era fornecido gratuitamente. E quando nascemos somos expulsos desse paraíso e começamos a experimentar a sensação de abandono, do não pertencimento, da falta de identidade, pois a identidade que tínhamos era a nossa mãe. E toda essa estranha sensação de não pertencimento, de estar sozinho no mundo… esse terrível vazio interior nos acompanhará por toda a vida. E sempre buscaremos formas de preenchê-lo. Faremos coisas absurdas, decisões imprudentes, escolhas erradas, caminhos obscuros… no anseio de acabarmos com esta angustia nascida com a vida.
Como se tudo isso não fosse o bastante, ao longo de nossa busca para preencher nossos vazios, acontecem traumas, tragédias, dilemas, lutos, mais abandonos, mais dores de existir. As relações interpessoais dificilmente preencherão esse vazio por muito, pois somos “unimultíplos” e, deste modo, desajustados.
Partindo deste prisma, a única resposta para a pergunta: “Como fazer que as pessoas gostem de mim?” – é, não se preocupe em satisfazer a balança alheia, pois se você conseguir o próprio equilíbrio interior e a amar-se a si mesmo, terá realizado o maior de todos os feitos.
Talvez a coisa mais necessária para prática do amor próprio e, de repente por isso, mais difícil, é tornar-se quem você realmente é. Não somos felizes e não conseguimos fazer com que gostem de nós, porque não somos livres para sermos quem nós somos.
Somos obrigados a nos adequar ao que os outros esperam que sejamos. Entenda, não é você que precisa deixar de ser quem você é, para ser aceito pela sociedade; é a sociedade que precisa aceitar você como você é. Se você se sente obrigado a se tornar quem não é, só para ter o afeto e a aceitação de uma pessoa ou do meio onde vive; essa pessoa e esse meio não são dignos de você. Saia deste meio e se distancie dessa pessoa. Ajuste-se somente a si mesmo na busca pelo autoconhecimento e só se prenda ao que te liberta.
Texto de Clara Dawn, escritora, psicopedagoga, psicanalista, pesquisadora e palestrante.
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