Há dentro em mim um estranho a quem chamo de eu-autêntico, porque possuo um modo peculiar de viver a vida: sou um homem de uma mulher só. Meus amigos estão sempre me convidando para sair por aí, jogar conversa fora, beber a noite inteira, dançar e fazer outras coisas que não quero revelar. Mas eu sempre respondo a mesma coisa: sou um homem de uma mulher só.

O nome dela é Bárbara e certamente ela é a mulher mais linda que meus olhos já viram. Bárbara, Bárbara! Meu Deus, como ela é Bárbara! Não Bárbara no sentido de barbárie, mas no sentido de sensacional, dinâmica, criativa e inteligente. Eu tenho por ela o maior amor do mundo. Por ela é que acordo todas as manhãs, por ela eu daria a minha vida. Não há no mundo mulher mais atraente, para mim, do que Bárbara.

Outro dia sua amiga, a Cristina, mulherão, estilo Juliana Paes, veio falar comigo. Estávamos na beira da piscina, quando a aspirante a Paes me fez um convite empolgante. Disse-me que sua família tem uma casa em Angra e que poderíamos ir para lá no final de semana. Eu respirei fundo olhando de soslaio aquele corpo curvilíneo, mas, sério, respondi que não poderíamos ir para Angra, porque sou um homem de uma mulher só.

Confesso que mesmo amando Bárbara loucamente, às vezes sinto-me cansado de ser esse homem de uma mulher só e tenho vontade ou, sei lá, necessidade, de sair por aí, conhecer outras pessoas, sorrir com elas, querer e ser querido. Congratular… sim, eu adoraria! Mas como, se sou um homem de uma mulher só?

O problema maior é que nesses últimos dias eu me sinto um girassol: dependente de luz e de calor humano, dependente de encantamento. Sinto-me estranho e muito mais só! Embora minha mente esteja repleta de pensamentos e sentimentos e desejos de fugir, eu simplesmente não consigo me mover além de uma caminhada no parque à noite. Se não for com Bárbara, não sei me divertir.

Ontem, as ruas estavam molhadas, porque chovera o dia inteiro presenteando a noite com lindas estrelas e um clima de agradável frescor. Caminhei sem destino. Pensava nos meus amigos que naquela hora estavam em um pub qualquer, ouvindo boa música e sorrindo. Desejei estar com meus amigos. Pensei em Cristina que estava em Angra e desejei estar lá também.

Num repente, lembrei-me de Bárbara e visualizei a razão de ter aceitado ser um homem de uma mulher só. Voltei para casa com uma decisão em mente.  Encontraria Bárbara e lhe diria que eu não estou satisfeito com essa situação, que não quero mais ser um homem de uma mulher só.

Então, entrei devagar, passo a passo, com cuidado. Não queria assustá-la. Subi as escadas quase flutuando e vi a porta do quarto semiaberta. Pude vê-la sentada frente ao computador diante de uma meia página em branco: dando-lhe vida, harmonia, musicalidade e cores textuais em Arial 12.

Pensei: – “Não, ela não é só. Definitivamente, ela não é só.  Ela tem a literatura por companhia” – Talvez um dia, quem sabe, eu aprenda a me divertir sozinho também. Mas por enquanto, diante da solidão criativa de Bárbara, quedo-me e a reverencio!

(PS. Fiz este texto pensando nas agonias de meu esposo por ser um homem de uma escritora amante da solidão e do silêncio. Acho que não deve ser fácil para ele. Mas ele insiste. Que bom!).






Clara Dawn é romancista, psicopedagoga, psicanalista, pesquisadora e palestrante com o tema: "A mente na infância e adolescência numa perspectiva preventiva aos transtornos mentais e ao suicídio na adolescência". É autora de 7 livros publicados, dentre eles, o romance "O Cortador de Hóstias", obra que tem como tema principal a pedofilia. Clara Dawn inclina sua narrativa à temas de relevância social. O racismo, a discriminação, a pedofilia, os conflitos existenciais e os emocionais estão sempre enlaçados em sua peculiar verve poética. Você encontra textos de Clara Dawn em claradawn.com; portalraizes.com Seus livros não são vendidos em livrarias. Pedidos pelo email: [email protected]