Neste 20 de novembro de 2024 é a primeira vez em que esta dada é um feriado. O dia marca a morte de Zumbi dos Palmares, um dos símbolos nacionais pela resistência à escravidão e enfrentamento ao racismo.
Para bem refletirmos sobre este dia, precisamos questionar como se deve referir aos afrodescentes. É “negro” ou “preto”? Embora a primeira seja usada corriqueiramente, inclusive em documentos oficiais e acadêmicos, para o músico e ativista ganês radicado no Brasil Nabby Clifford, “preto” é o único termo aceitável.
“Um país, o Brasil, usa palavras como lista negra, dia negro, magia negra, câmbio negro, vala negra, mercado negro, peste negra, buraco negro, ovelha negra, a fome negra, humor negro, seu passado negro, futuro negro. Não deveria chamar uma criança de negro (…). Pega o dicionário de língua portuguesa, está escrito: negro quer dizer infeliz, maldito. Brasileiro quando valoriza alguma coisa não fala negro, ele fala preto”.
“Ele não come feijão negro, come feijão preto, o carro dele não é carro negro, o carro dele é carro preto, ele não toma café negro, toma café preto, a fome é negra, quando ganha na loteria, ganha uma nota preta. Se branco não é negativo, preto também não é negativo.
Mas negro não, negro é palavra 100% negativa, e atrasa, isso causa morte, causa miséria, doenças. Já que o mundo mudou, vamos mudar nossa linguagem também”, diz Clifford,neste vídeo. Confira:
Uma pesquisa rápida sobre a militância racial permite ver que o termo “negro” e usado amplamente. Coletivos e grupos organizados assumem a palavra no nome e em textos. Por outro lado, é crescente o uso de “preto”, embora a palavra soe estranha a quem está fora da militância.
Em busca de respostas mais consistentes, recorri à amiga e ativista Mirtes Santos, do Coletivo Negrada. “Os negros que não estão no movimento e não compreendem o que o Clifford falou repudiam o ‘preto’, pois a palavra sempre foi usada como forma de agredir a identidade negra. O termo preto está sendo ressignificado”, explica Mirtes.
Contudo, esse processo não implica na repulsa à palavra “negro” nos moldes que os norte-americanos fizeram com “nigger”. A “n-word”, como eles chamam, era usada corriqueiramente, mas com o avanço das lutas dos movimentos pelos direitos civis foi desconstruída a ponto de se tornar tabu.
Talvez isso não venha a acontecer no Brasil, para desgosto de Clifford. O mais provável é que as duas palavras coexistam, porém sem a carga negativa que o racismo estrutural incrustou. Inclusive, expressões como “dia de preto”, “coisa de preto” ou “a coisa está preta” mostram que a palavra “preto” pode sim ser usada para perpetuar conceitos racistas.
E por mais que a palavra seja ressinificada e tenha seu sentido empoderado, dependerá do contexto para transmitir a mensagem completa, como mostram esses dois Tweets que achei enquanto pensava no texto e assistia Lewis Hamilton vencer o GP da Alemanha.
“E mais uma história de um preto que vence! Parabéns Lewis Hamilton…”; “Na boa, nunca vi um preto tão charmoso, deve ser o único também, né, Lewis Hamilton?”.
O primeiro é um exemplo do uso inofensivo e empoderado de “preto”. Já o segundo, nem precisou de termos pejorativos para transbordar racismo.
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