Nasceu no dia 15 de setembro de 1933 em Dores da Boa Esperança, uma pequena cidade do sul do estado de Minas Gerais, Rubem Alves, educado no seio de uma família protestante, muito cedo teve de se confrontar com a sua diferença. O destino inscrito na sua diferença leva-o, depois do Ginásio, a estudar teologia no seminário Presbiteriano do Sul, um dos mais conhecidos seminários evangélicos da América Latina.
“Meu pai era rico, quebrou, ficou pobre. Tivemos de nos mudar. Dos tempos de pobreza só tenho memórias de felicidade. Conheci o sofrimento quando melhoramos de vida e nos mudamos para o Rio de Janeiro. Meu pai, com boas intenções, me matriculou num dos colégios mais famosos do Rio. Foi então que me descobri caipira. Meus colegas cariocas não perdoaram meu sotaque mineiro e me fizeram motivo de chacota. Grande solidão, sem amigos. Encontrei acolhimento na religião. Religião é um bom refúgio para os marginalizados.”
Concluído o seminário, torna-se pastor de uma comunidade presbiteriana no interior de Minas e casa com Lídia Nopper, com quem teve três filhos, Sérgio, Marcos e Raquel. Depressa, porém, o pastor tomou consciência de que a sua ousadia evangélica o levava para terrenos difíceis.
“Eu achava que religião não era para garantir o céu depois da morte, mas para tornar esse mundo melhor, enquanto estamos vivos. Claro que minhas ideias foram recebidas com desconfiança…”
Em 1963, viaja para Nova York para fazer uma pós-graduação. É aí que o Golpe Militar de 31 de março de 1964 o surpreende, nas vésperas de conclusão do mestrado. Defendida a tese (“A theological interpretation of the meaning of the Revolution in Brazil”), regressa à sua paróquia, onde deixara mulher e filhos.
Nesse período viveu sob o medo intenso da Ditadura Militar. Acusado de ser subversivo, foi listado injustamente entre pastores procurados pelos militares. Era o preço de pensar de forma não ortodoxa. Viveu o cansaço da tensão.
“Foi então que a United Presbyterian Church – EUA (Igreja Presbiteriana Unida dos Estados Unidos da América do Norte), em combinação com o presidente do seminário teológico de Princeton, me convidaram a fazer um doutoramento. Não me esqueço nunca do momento Spreciso quando o avião decolou. Respirei fundo e sorri, descontraído, na deliciosa euforia da liberdade. Ainda hoje, quando um avião decola, sinto de novo aquele momento”.
O exílio durou até 1968. Doutorado, volta ao Brasil para se despedir da Igreja Presbiteriana e experimentar o desemprego. Em 1969, uma Faculdade do interior (a Faculdade de Filosofia de Rio Claro) acolhe-o. Aí permaneceu até 1974, ano em que finalmente ingressa no Instituto de Filosofia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde fez a maior parte da sua carreira acadêmica até se aposentar nos primórdios da década de 1990.
“Golpes duros na vida me fizeram descobrir a literatura e a poesia. Ciência dá saberes à cabeça e poderes para o corpo. Literatura e poesia dão pão para corpo e alegria para a alma. Ciência é fogo e panela: coisas indispensáveis na cozinha. Mas poesia é o frango com quiabo, deleite para quem gosta…Busco escrever simplesmente o que me dá na cabeça e no coração, embora ainda me sinta amarrado por antigas mortalhas acadêmicas.
Com a literatura e a poesia comecei a realizar meu sonho fracassado de ser músico: comecei a fazer música com palavras.
Em 1984 iniciou o curso para formação em Psicanálise. Teve sua clínica até 2004. Seu contato com os pacientes incrementou seu conteúdo que, transformados em palavras, compuseram diversas de suas crônicas sobre o cotidiano.
“Sou psicanalista, embora heterodoxo. Minha heterodoxia está no fato de que acredito que no mais profundo do inconsciente mora a beleza. Com o que concordam Sócrates, Nietzsche e Fernando Pessoa. Exerço a arte com prazer. Minhas conversas com meus pacientes são a maior fonte de inspiração que tenho para minhas crônicas.”
Residindo há várias décadas em Campinas, Rubem Alves é um apaixonado pela vida, um compulsivo fruidor da vida. Afirma que ainda não escreveu todos os textos e todos os livros que traz no pensamento, ainda não sentiu, amou, brincou e riu o bastante, ainda não respondeu a todas as cartas e mensagens dos amigos, ainda não provou de todas as ausências e de todas as saudades, ainda não espreitou todos os mistérios do mundo e dele próprio.
“Eu não tenho medo de morrer… Só tenho pena. A vida é tão boa”.
Texto adaptado a partir da apresentação feita por Ademar Ferreira dos Santos, educador português, para a versão portuguesa do livro “Por uma Educação Romântica”. Assista ao belíssimo documentário sobre a vida e obra de Rubem Alves
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