Clarice Lispector em: 8 respostas imprevisíveis às suas perguntas

Clarice Lispector começou a trabalhar como jornalista em 1940, na Agência Nacional, e publicou as primeiras reportagens e entrevistas na revista Vamos Ler! e no jornal A Noite. Enquanto as notícias sobre a Segunda Guerra Mundial predominavam nas manchetes dos jornais, ela contribuía ocasionalmente com uma entrevista com um embaixador, um intelectual ou um político importante.

No fim dos anos sessenta, já escritora e cronista conhecida, Clarice foi convidada a fazer entrevistas e aceitou para completar o orçamento doméstico. Entre maio de 1968 e outubro de 1969, enquanto escrevia o romance Uma aprendizagem ou o Livro dos Prazeres e o livro infantil A Mulher que Matou os Peixes, ao mesmo tempo em que compunha crônicas para o Jornal do Brasil, Clarice publicou regularmente na revista Manchete, na seção “Diálogos Possíveis com Clarice Lispector”.

Enquanto os estudantes se revoltavam em Paris e na Europa do leste, enquanto Apolo 11 chegava à Lua, enquanto a guerra assolava o Vietnã, enquanto a repressão militar no Brasil aumentava, ela fazia as suas entrevistas. Com frequência ela fazia perguntas mais abstratas, profundas, filosóficas, estranhas: “Qual é a coisa mais importante do mundo?”, Qual é a coisa mais importante para uma pessoa como indivíduo?” e “O que é o amor?” eram as favoritas.

Selecionamos oito dessas respostas. Vale a pena conferir:

Que é que você gostaria de ter sido e não foi?

“Não creio que prestasse em profissão nenhuma. Tenho grande tendência a não fazer nada que seja obrigação”. Jorge Amado, escritor, autor de “Gabriela, cravo e canela”, é o escritor brasileiro mais traduzido no mundo.

Você é de direita ou de esquerda?

“Eu me recuso absolutamente a ser de esquerda ou de direita. Cheguei a essa atitude diante de duas coisas, lendo dois volumes sobre a guerra civil na história. Verifiquei então o óbvio ululante: de parte a parte todos eram canalhas. Rigorosamente todos. Eu não quero ser canalha da esquerda nem canalha da direita”. Nelson Rodrigues, escritor, considerado o maior dramaturgo brasileiro.

Qual é a coisa mais importante para uma pessoa como indivíduo?

“Saber situar-se neste mundo. Ter prazer em ser útil e solidário com os que sofrem; dar ao amor o sentido universal que merece. Nascemos para amar”. Oscar Niemeyer, o grande nome da Arquitetura Moderna.

Como você resumiria o conteúdo da palavra amor?

 “Amor é dádiva, renúncia de si mesmo, na aceitação do outro. Amar o próximo como a si mesmo e a Deus sobre todas as coisas”. Fernando Sabino, escritor, autor de O encontro marcado. 

Qual é a coisa mais importante do mundo?

“A coisa mais importante do mundo é a possibilidade de ser-com-o-outro, na calma, cálida e intensa mutalidade do amor. O Outro é o que importa, antes e acima de tudo. O amor genuíno ao Outro me leva à intuição do todo e me compele à luta pela justiça e pela transformação do mundo”.  Hélio Pellegrino, escritor e psicanalista, respeitado pelos estudantes na época  da ditadura militar de 64. 

Você acredita em milagre?

 “Eu só acredito em milagre. Na mais miraculoso que a realidade de cada instante. Acredito mais no sobrenatural. O sobrenatural seria o natural mal explicado, se o natural tivesse explicação”. Pedro Bloch, dramaturgo, escreveu As mãos de Eurídice, Dona Xepa e os Pais Abstratos.

O que você deseja alcançar?

 “Desejaria alcançar a calma no meio da paixão. Desejaria alcançar uma tal capacidade de amar que me pudesse fazer útil ao meu semelhante”.  Vinicius de Moraes, poeta, diplomata, compositor.

Liberdade interior ou exterior?

“Liberdade total. Se como homem fui um pequeno burguês adaptado, como artista me vinguei na amplidão do amor”. Tom Jobim, compositor, cantor, arranjador.

 

Fonte: Clarice Lispector Entrevistas, editor Rocco, 2007.  

 

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