A morte não tem explicação. Você reúne a família para passear numa lancha que parece ter a bênção da proteção, batizada de Jesus, e visitar o cânion do Lago das Furnas, numa pequena e badalada cidade mineira, Capitólio, de 8 mil habitantes.
Você está relaxado. Você enxerga a natureza pela câmera do celular, postando os acontecimentos animados de seu lazer em família, mostrando aos seus seguidores a beleza do cenário. Era para ser um entretenimento de uma hora, com música e exclamações, mas rouba o tempo inteiro da sua vida e de quem você ama. Tudo vira uma pergunta assustadora: como que aconteceu isso? Por que logo agora?
Há uma inesperada queda de um paredão, de uma montanha em segundos. Não existe como fugir, como dar a meia-volta, como entender os gritos de socorro, como redimensionar a tragédia.
Uma rocha das encostas do cânion desabou sobre uma procissão de turistas no sábado (8/1). Quatro embarcações foram atingidas. Segundo informações do Corpo de Bombeiros, o acidente deixou dez mortos.
É um marco que todo mundo frequenta em Minas, qualquer um poderia estar no lugar das vítimas. Não há quem não tenha passado pelo canal e imaginado o seu próprio fim. Eu faleci mentalmente reprisando recentes navegações. Eu me vi entre os escombros. Eu me vi perdendo os meus filhos e a minha esposa. Eu estive lá, em outra hora, em outro dia, e o deslizamento já estava soltando as suas pedras secretamente. Não foi conosco por um detalhe.
Não tem lógica. Somos terrivelmente frágeis, tantos momentos nos livramos da despedida em definitivo.
Eu assisto às gravações dos sobreviventes várias e várias vezes e não consigo parar de repetir. Não consigo parar de morrer junto, querendo ver se restava alguma chance de escapar, alguma esperança viva. Texto de Fabrício Carpinejar