Nascemos geneticamente humanos, mas a humanização depende do treino de habilidades que não são inatas, mas aprendidas no decorrer da vida. E embora não exista uma idade especifica para investir em uma “alfabetização emocional”, a infância é o período propicio e necessário para que esta seja desenvolvida, estimulada e internalizada.
As habilidades socioemocionais são imprescindíveis para que ocorra um convívio salutar da pessoa consigo e com suas relações interpessoais, visto que habilidades intrapessoais e interpessoais estão diretamente relacionadas. No entanto, infelizmente estas não eram incluídas no planejamento curricular das escolas.
Então, a única maneira de aprendê-las seria na prática, entre “erros e acertos”, no convívio da vida diária e na vivência de situações que envolvessem o altruísmo, o controle da impulsividade, o comportamento de civilidade, a análise ambiental, a autonomia, a autoanálise, a empatia e a solução de problemas práticos.
Neste contexto, a família e os educadores têm um papel fundamental no direcionamento das crianças e adolescentes. O problema se configura quando os próprios educadores também não possuem estas habilidades desenvolvidas, principalmente no que concerne aos pais, que são o primeiro modelo de comportamento dos filhos.
Como diz o velho ditado “mais vale um exemplo que mil palavras” e de nada vale dizer e não fazer, para servir como modelo, visto que são nas ações diárias que a criança internaliza maneiras de (re)agir e se comportar, ou seja, elas se identificam e se modelam principalmente nos cuidadores. Sendo assim, a criança vai moldando sua forma de atuar no mundo através das vivências e dos aprendizes familiares e que infelizmente algumas vezes não são adequados, tampouco salutares, como nos casos de Famílias de Alta Emoção Expressa (FAEE).
A boa notícia é que desde 2020, o treino de habilidades sociais está incluído como proposta pedagógica no currículo escolar, onde são priorizadas 10 competências socioemocionais, de acordo com as diretrizes da Base Nacional Comum Curricular. Esta iniciativa é extremamente necessária, visto que a educação tem sido percebida, avaliada e investida principalmente nos aspectos cognitivos, racionais e intelectuais, valorizando prioritariamente o conhecimento, mas não o preparo para a vida, para o convívio com os outros e seus desafios, nem para a conscientização e manejo das emoções.
Ou seja, não é uma educação integral e plena voltada para o autoconhecimento e o autodesenvolvimento de um ser humano em sua plenitude, mas principalmente para o conhecimento de disciplinas e ciências do mundo externo, de como ter a melhor performance cognitiva e conhecimento técnico para lidar com aspectos científicos e tecnológicos. E a isto atribuímos muitas vezes o sentido de “ter sucesso na vida”.
E no tocante a lidar com as questões da vida? E como fazer com relação ao manejo das relações interpessoais? Em nenhum momento quero dizer que o aspecto racional não seja importante, mas do que adianta a pessoa estar preparada cognitivamente para exercer um cargo ou uma profissão na sociedade, se não está preparada adequadamente para um convívio nesta sociedade? Pior que isso, ainda há aquelas pessoas que em tudo encontram um conflito, um problema, uma contenda, uma discórdia, geralmente percebendo o outro e o ambiente com hostilidade ou ameaça. Definitivamente, a proposta pedagógica precisa ser atualizada de acordo com as necessidades da pessoa em formação, bem como da sociedade em transformação.
Reflitamos que as pessoas não se relacionam emocionalmente com conteúdos e disciplinas mas sim com pessoas, o tempo todo, no nosso dia a dia, no ambiente familiar, no trabalho, numa relação conjugal ou de amizade. Portanto, é imprescindível lidar com as circunstâncias da vida de maneira empática e assertiva, sendo necessário o treino das habilidades sociais.
Algumas vezes, na clinica infantil, quando os pais apresentam queixas de filhos irritados, agressivos ou “mal-educados”, verifica-se algumas vezes que os pais também precisam de acompanhamento para desenvolverem principalmente a adequação socioemocional, o autocontrole, o sentido de justiça avaliativa e a assertividade. Por outras palavras, os pais também necessitam de acompanhamento em seu sofrimento emocional pois eles também pessoas, tem suas questões e modelos de comportamentos que foram perpassados e internalizados por suas famílias.
Em linhas gerais e como o próprio nome sugere, esta técnica consiste em observar os próprios comportamentos e reações a situações da vida, anotando-as em um caderno ou agenda. A anotação é importante porque com o tempo a pessoa esquece aqueles sentimentos e comportamentos que precisam ser avaliados enquanto adequação socioemocional.
O foco desta estratégia reside no autoconhecimento, na reestruturação dos pensamentos disfuncionais que são a base para os comportamentos descontextualizados e que são gatilhos para conflitos internos e externos, tais como agir com comportamentos impulsivos ou agressivos, por exemplo. Estes dados são levados para o consultório ou terapia de grupo para serem avaliados e trabalhados através de outras técnicas mais aprofundadas e tendo por objetivo a conscientização do porque daquele comportamento disfuncional, promovendo sua mudança nas dimensões pessoal, comportamental e situacional.
Texto da psicoterapeuta, expert em Medicina Psicossomática, Soraya Aragão. Saiba mais sobre o seu trabalho aqui.
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