Seriam mesmo os agrotóxicos venenos desnecessários servindo basicamente aos interesses das multinacionais? Ou seriam aliados dos agricultores: insumos necessários para o combate das pragas que destroem as lavouras? A intenção deste artigo é propor alguns pontos para reflexão no sentido de contribuir para que o leitor tenha condições de formar sua própria opinião sobre o uso de agrotóxicos, sem a pretensão de esgotá-la. Nosso viés está focado na busca de uma visão pautada pelo rigor da pesquisa científica, com respeito às eventuais correntes ideológicas que perigosamente podem nos afastar da verdadeira ciência. Confira:
O glifosato é o agrotóxico mais usado no Brasil e no mundo. Sua presença é tão grande que já foram inclusive encontrados vestígios da substância em lotes de mel e em barras de cereais. Agora, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) abriu uma consulta pública sobre a sua regulação.
Um estudo realizado pela Universidade do Texas sugere que o glifosato possa afetar o microbioma intestinal das abelhas, deixando-as vulneráveis a infecções. Em 2015, o Centro Internacional de Pesquisas sobre o Câncer, ligado à Organização Mundial de Saúde, indicou que o glifosato teria um provável efeito cancerígeno em humanos, associada ao surgimento de câncer de mama e de próstata. E a cientista Stephanie Seneff, que já publicou mais de 170 artigos acadêmicos revisados por pares, sugeriu que o glifosato é passado para criança pelo leite materno e ele pode ser o responsável pelo alto crescimento de crianças com autismo.
Diante de tudo isso, a Anvisa concluiu que é necessário uma reavaliação toxicológica do composto, para que ele possa continuar sendo vendido no Brasil. Antes da decisão final sobre o assunto, no entanto, a Anvisa está realizando uma consulta pública durante 90 dias, para que a sociedade possa se manifestar. Somente após esse período será definida uma nova regulação para o uso do glifosato. A substância está presente em 110 agrotóxicos comercializados no Brasil por 29 empresas diferentes.
Consulta pública sobre o glifosato
Diante de tudo isso, a Anvisa concluiu que é necessário uma reavaliação toxicológica do composto, para que ele possa continuar sendo vendido no Brasil. Antes da decisão final sobre o assunto, no entanto, a Anvisa realizou uma consulta pública durante 90 dias, para que a sociedade pudesse se manifestar. A consulta pública terminou em julho de 2019 e os resultados ainda não foram divulgados.
500 milhões de abelhas mortas em 3 meses
O principal causador, afirmam especialistas e pesquisas laboratoriais analisadas pela reportagem, é o contato com agrotóxicos à base de neonicotinoides e de Fipronil, produto proibido na Europa há mais de uma década. Esses ingredientes ativos são inseticidas, fatais para insetos, como é o caso da abelha, e quando aplicados por pulverização aérea se espalham pelo ambiente, relata o texto.
A importância das abelhas para o meio ambiente
“As abelhas são as principais polinizadores da maioria dos ecossistemas do planeta. Voando de flor em flor, elas polinizam e promovem a reprodução de diversas espécies de plantas. No Brasil, das 141 espécies de plantas cultivadas para alimentação humana e produção animal, cerca de 60% dependem em certo grau da polinização deste inseto. Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), 75% dos cultivos destinados à alimentação humana no mundo dependem das abelhas.
Os principais inimigos das abelhas são os agrotóxicos neonicotinoides, uma classe de inseticidas derivados da nicotina, como por exemplo o Clotianidina, Imidacloprid e o Tiametoxam. A diferença para outros venenos é que ele tem a capacidade de se espalhar por todas as partes da planta. Por isso, costuma ser colocado na semente, e tudo acaba com vestígios: flores, ramos, raízes e até no néctar e pólen. Eles são usados em diversas culturas como de algodão, milho, soja, arroz e batata”, afirmam os especialistas. (Para ver reportagem completa sobre as abelhas acesse Agência Pública).
É possível produzir alimentos para o Brasil sem agrotóxicos?
O mote de vários grupos de pesquisa comprometidos com as cadeias produtivas é a busca constante de alternativas de controle de pragas que sejam cada vez menos dependentes dos produtos químicos. No entanto, essas alternativas devem merecer a confiança do produtor e ter custo competitivo. Até que possamos abrir mão definitivamente dos agrotóxicos, situação que, com muito otimismo, levará ainda muitos anos, é realista pensar que a Embrapa, as universidades e os institutos estaduais de pesquisa vêm diligentemente procurando essas alternativas. Tratam-se de pesquisas sobre medidas de controle pautadas em ensaios com o devido rigor científico: substituição de produtos muito tóxicos por outros menos tóxicos (químicos ou biológicos), obtenção de cultivares resistentes ou tolerantes às pragas, uso racional da água em diferentes sistemas de irrigação, rotação de culturas, vazio fitossanitário, tecnologias de aplicação de produtos, solarização do solo, correção e adubação do solo, sistemas de produção de sementes e mudas sadias, cultivo protegido, entre outras. A adoção dessas medidas dentro da filosofia de controle (ou manejo) integrado, certamente reduzirá a necessidade do uso de agrotóxicos, independente do modelo de produção (convencional, orgânico, agroecológico, biodinâmico etc.).
Melhores resultados poderiam advir da continuada capacitação de produtores e extensionistas nessas práticas de cultivo, muitas delas já fartamente divulgadas pela pesquisa. No que se refere à ciência básica, é necessário ainda desenvolver e aperfeiçoar técnicas de detecção de resíduos para fins de monitoramento dos alimentos, apoiar as empresas de agrotóxicos no desenvolvimento e avaliação de produtos menos tóxicos, além de incentivar e fortalecer no ambiente acadêmico a cultura da importância de produzir alimentos saudáveis. (Excerto de É possível produzir alimentos para o Brasil sem agrotóxicos?, de Carlos A. Lopes – Pesquisador na Embrapa Hortaliças. Doutor em fitopatologia pela Universidade da Flórida).