Este texto é para pais/mães quem têm entre 35 e 50 anos. Com todas aquelas privações materiais, afetivas e rigidez de costumes, uma das coisas mais positivas que os nossos pais, inconscientemente, nos ensinaram foi que o sofrimento era a regra do processo de existir, e a felicidade, a exceção.
Foi assim nós crescemos e amadurecemos acostumados a lutar muitíssimo pelos momentos de exceção, pela felicidade. Estar triste e insatisfeitos, na maior parte do tempo, não causava estranheza, afinal, era a regra. Era muito comum ouvir nossas avós dizerem: “estamos como Deus quer”, “a gente vai tocando a vida”… em seguida, elas levantavam para fazerem suas obrigações sem reclamar.
E foi em meio a essa pachorra que a gente formou a nossa inteligência emocional: resiliente, silente, ensimesmada, forte além dos próprios limites e sem direito de fraquejar, de confiar e delegar tarefas, de se entregar às emoções e sentimentos mais humanos, de confidenciar uma fraqueza psicológica, um erro de cálculo, um desvio de conduta, uma travessura impensada…
Uma vez jovens adultos, nós dissemos que não deixaríamos faltar coisa alguma aos nossos filhos; que daríamos a eles, tudo que não tivemos. E assim, fazemos. Lutamos exaustivamente para que nossos filhos estudem em boas escolas, que tenham acesso às facilidades tecnológicas, que se vistam bem, que viagem e conheçam o mar mais cedo possível, que comam todas as gostosuras que vida tem a oferecer.
Mas o tempo passou e percebemos que nossos filhos se tornaram ícones de uma geração sofrida, angustiada, ansiosa, deprimida e sem esperança. Se tornaram ícones da geração que mais se automutila, mais se isola do mundo e mais se mata. Hiperconectados virtualmente num mundo de informações falsas, entretenimentos rasos e discursos de ódios, nossos filhos se tornaram, o público alvo da indústria farmacêutica que transforma a tristeza natural à vida, em patologia e a medicaliza; transforma a ansiedade normal do processo cerebral adolescente, em patologia e medicaliza.
Viver dói. Crescer dói mais ainda. A felicidade não é a regra da vida. É a exceção. Mas o mundo globalizado parece oferecer uma felicidade constante, desde que você consuma: A, B, C e não deixe para depois, o D. Uma felicidade tão fácil e ao mesmo tempo intangível, porque ela é líquida. Nunca tivemos tanto e nunca fomos tão insatisfeitos. Nunca estivemos tão conectados e nunca formos tão sozinhos.
Sim, nossos pais erraram enquanto tentavam acertar. Sim, nós também erramos enquanto tentamos acertar. E está tudo bem. Não há um elixir para se criar crianças perfeitas. Mesmo porque o mundo jamais foi e jamais será perfeito. O que é possível fazer e ainda há tempo, é investir numa educação parental positiva. Reconhecer que erramos e que a única coisa que podemos fazer para neutralizar um aprendizado ruim, é construir um bom aprendizado.
Não é tarde demais
O que fazer? O método é bem simples, mas requer devoção responsável. Eu estudei muito sobre educação parental, fiz dela uma missão, mas as dicas que vou descrever aqui, aprendi praticando. Consiste em 3 práticas:
1 – Retarde o máximo possível o primeiro contato da criança com telas conectadas à internet
Não se deve oferecer celular para crianças com menos de 12 anos. Você não daria álcool ou uma arma para seu filho de 6 anos, por exemplo, daria? Então não o deixe à mercê de telas com acesso à internet, pois seria a mesma coisa.
2 – Escolha um dia no mês para ser o dia da ‘bagunça’
Se existe uma coisa da qual eu nunca me arrependi foi de fazer isso com meus filhos. Algumas vezes, do nada, eu dizia que o dia da ‘bagunça’ seria, por exemplo, na quarta-feira, então eu faltava o serviço e eles não iam a escola. Algumas pessoas podem considerar isso, uma grande irresponsabilidade. Mas, eu perdi o meu filho, aos 20 anos. E quando me lembro de todos os nossos dias da ‘bagunça’, sinto que valeram muito a pena. O dia da ‘bagunça’ é um dia sem regras, onde ninguém precisa arrumar a cama ou lavar a louça, a única regra é fazer bagunça juntos. Assistir filmes, brincar, contar piadas, dançar, comer as besteiras que não se come no dia-a-dia. É muito importante que os pais estejam abertos para fazer um momento de interação psicoemocional com os filhos. Onde todos possam confidenciar algo que esteja incomodando. Nessa hora é necessário, ouvir sem julgamentos e não deixar que o momento se transforme em brigas. Não se esqueça nunca: a única pedagogia que funciona é a do amor, se ela não funcionar, coisa alguma funcionará.
3 – Busque sempre por informações sobre como lidar com determinada situação com os filhos
Minha avó dizia: “antes de ter filhos eu tinha 3 teorias sobre como educar filhos. Hoje eu tenho 3 filhos e nenhuma teoria”. Como eu disse, os pais/mães não super heróis/heroínas, são, como todos, aprendizes na arte de viver. E está tudo bem, não saber lidar com a educação dos filhos, desde que se tenha o interesse em aprender sobre aquilo que não consegue sozinho. Não é só a educação dos filhos que importa. A educação dos pais também é necessária. Atualmente com a internet, ficou muito mais fácil buscar por conhecimentos acerca de educação parental. Então, não se envergonhe por não saber o que fazer em determinada situação com seus filhos, se conecte com grupos de pais e siga sites que tratem desse assunto.
Clara Dawn é escritora, psicanalista e neuropsicopedagoga. É fundadora do Portal Raízes e do IPAM – Instituto de Pesquisas Arthur Miranda em prevenção à drogadição, aos transtornos mentais e ao suicídio na infância e na adolescência.
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