Uma criança não nasce para ensinar coisa alguma aos seus pais. Uma criança não é um ser especial enviado por Deus para salvar relacionamentos ruins, ou transformar a vida de quem quer que seja. Uma criança não é a extensão do pai ou da mãe. Uma criança não é a projeção dos sonhos frustrados de alguém. Uma criança não é um príncipe e tampouco uma princesa. Uma criança não é um super-herói ou uma super-heroína. Uma criança não é um anjo e nem um diabinho.
Uma criança não deve ser um adulto em miniatura que transita no mundo dos adultos como se adulto fosse: ouvindo conversas de adultos, assistindo coisas de adultos, jogando jogos de adultos, encenando o mesmo teatro que os adultos encenam nas redes sociais e adotando as agendas e os hábitos dos adultos. Uma criança é apenas uma criança. Isso significa que ela não sabe o que pensar e nem como se comportar com o próprio mundo e muito menos com o mundo dos adultos.
Os desafios das mães/pais são constantemente novos, mas as ferramentas psíquicas para lidar com eles ainda são primitivas
Vivenciamos o boom da tecnologia e da globalização. Diariamente somos conduzidos por atualizações em toda essa parafernália eletrônica que consumimos como se fossem o último gole d’água da fonte da felicidade. Entretanto, o nosso cérebro não evolui na mesma proporção em que a tecnologia evolui. As nossas ferramentas psíquicas ainda são as mesmas de centenas de milhares de anos. Por isso todos nós temos desenvolvidos transtornos de ansiedade e milhões estão em depressão. Nosso cérebro está colapsado.
E dentre esse ‘todos nós’, há um grupo muito preocupante, as mães. Uma mãe não é uma rainha, tampouco uma super-heroína. Uma mãe é, antes de tudo, uma mulher, um ser unimultiplo com todos os seus conflitos do processo de existir. Também por isso, as mães estão especialmente sobrecarregadas e enfermas, física e mentalmente. Claro, elas não são apenas mulheres que lutam pelo direito de serem mais do que mães e donas de casa, elas são aquelas criaturas humanas que têm que lidar com múltiplas jornadas de trabalho: o emprego, as tarefas domésticas, a educação dos filhos, o equilíbrio das finanças e do casamento (se casada for). Neste artigo me refiro somente as mães que não têm apoio algum de seu companheiro (tampouco psicossocial) na educação dos filhos e na administração do ambiente familiar.
Então, é compreensivo que essas mães se sintam exaustas demais para lidar com os filhos: com os pequenos e também com os adolescentes. É compreensivo que essas mães possam cair no engano de acharem que seus filhos estão seguros dos perigos do mundo por estarem dentro de casa, e que o acesso indiscriminado ás telas é um bom aliado para deixá-las entretidas. E tão logo, essas crianças e esses adolescentes são desafiados a obedecerem ás regras, a conviverem com outras crianças, a experimentarem outro tipo de atividade que não seja numa tela, elas se tornam pequenas tiranas: esperneiam, xingam, emburram, agridem ou ficam demasiadamente entediadas como se o mundo fosse acabar só porque elas não podem fazer outra coisa senão usar uma tela.
As mães precisam de ajuda
Antes de julgar uma mãe, seja empático. Visite-a e ajude-a. Leve uma comida pronta, se ofereça para fazer as compras, para ficar com as crianças para ela descansar, para ajudar na limpeza da casa… As mães precisam muito de ajuda. E tudo bem precisar de ajuda. Tudo bem buscar ajuda de profissionais da saúde mental. Tudo bem buscar leituras e assistir vídeos de profissionais da educação. Tudo bem errar muitas vezes. Tudo bem não acertar o jeito de corrigir os filhos. Tudo bem.
O que não pode continuar acontecendo é não se informar sobre o que é, ou não, indicado para crianças. O que não pode continuar acontecendo é não praticar a pedagogia do amor associada á firmeza e à disciplina. O que não pode continuar acontecendo é não estabelecer, criar conjuntamente com a criança e impor as regras da casa. Mãe não é coleguinha. Mãe é educadora. A boa mãe é aquela que vai se fazendo desnecessária aos filhos. Ou seja, é aquela que consegue validar os pensamentos, as emoções, os sentimentos da criança sem julgamentos e prepara para vivenciar num mundo extremamente opressor e excludente, de maneira cooperativa, empática e resiliente.
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Texto de Clara Dawn, especialista em prevenção á drogadição, aos transtornos mentais e ao suicídio na infância e na adolescência. Inspirado na crônica fictícia “Não é síndrome de nada, é falta de educação mesmo” – Autor desconhecido.